Wednesday, August 19, 2009

Conversa com o Presidente da Pró-Praia, Dr. ALCIDES OLIVEIRA-

Entrevista no A NAÇÂO:

1. O que vai mudar, realmente, na Associação Pró-Praia com a nova Direcção eleita?
A nova direcção, espera inaugurar um novo tempo para a Associação Pró Praia. Não se tome isso como um sinal de ruptura com as direcções anteriores, pois não nos desviaremos da nobre caminhada de promover a Praia, nem deixaremos de seguir na dinâmica já instalada por aqueles que nos antecederam. Entretanto, o nosso propósito é cumulativo, por um lado, e inovador, por outro. Cumulativo na lógica da continuidade e inovador na disposição que teremos em introduzir novas formas de ser e de estar nesta Associação. Temos uma equipa bem motivada e pronta para fazer a diferença. Nesse sentido, acredito que muita coisa irá mudar. Reforçar a credibilidade da Pró Praia, alargar e aprofundar as parcerias no contexto local, nacional e internacional, são assuntos cimeiros da estratégia da nova direcção.


2. Para muita gente, a Pró-Praia é demasiado arreigada ao regional ou até mesmo muito localista. Qual o seu comentário?
Não assumimos este estigma, por ser absolutamente falaciosa. Somos estruturalmente contra todas as formas de bairrismos e de defesas arreigadas das causas. Somos uma associação de natureza cívica e de vocação promocional das causas e das coisas desta cidade que, por ser capital, é um pouco de todos nos. Há causas locais sem serem localistas, assim como há promoções regionais sem serem regionalistas. Temos uma associação aberta e inclusivista. Na Associação Pró Praia, contrariamente a uma ou outra tentativa de nos acantonar e de nos reduzir a um punhado de “praienses zangados”, paira um ambiente de participação, de conhecimento e de colaboração em relação a causas estruturantes para a Praia e para Cabo Verde.



3. Na sua opinião, quais são os grandes desafios para a Praia, para os praienses e para os que habitam nesta cidade-capital?

A Praia tem enormes desafios. Temos uma cidade que precisa de ser olhada a partir de um real pacto entre o Governo, a Edilidade e a Sociedade. Só de forma unida, organizada e sistematizada teremos uma visão estratégica para a cidade da Praia. Enquanto Pró Praia, queremos lançar várias reflexões e vários debates sobre o futuro da Praia. Queremos estar num espaço urbano mais e melhor equipado, com pessoas mais capazes em tornar-se parte das soluções; queremos estar numa ecologia mais limpa e saudável. Igualmente, queremos viver numa sociedade com menos desemprego, menos pobreza, menos vulnerabilidade, menos insegurança pública, mais justiça social. Que se estabeleça o saneamento básico, a rede de esgotos, de água e de energia. O grande desafio da Praia é o estabelecimento da qualidade de vida e do bem-estar social. Temos a visão clara de ser esta a nossa grande causa e a razão pela qual estamos na Associação Pró Praia.

4. Em termos institucionais, quais as relações que conta estabelecer com a edilidade da capitalina e com o Governo de Cabo Verde?

A nossa postura, conforme já realçado anteriormente, é de parceria e de colaboração. Realçar a complementaridade da sociedade civil organizada, sem a qual o tal pacto estratégico não seria possível. A Edilidade e o Governo são parceiros cruciais. Pretendemos incrementar as nossas relações com tais entidades que não passam por cumplicidades politico-partidarias e/ou ideológicas. A Associação Pró Praia espera ter contactos permanentes e relações privilegiadas com todas as entidades públicas que interajam em relação à Praia. Naturalmente que saberemos, pelo dialogo, colocar as nossas reivindicações e as nossas demandas, sempre com o espírito da defesa do interesse da colectividade praiense.

5. Tudo indica que a Associação Pró-Praia passou por um período de fraca participação dos associados. Como reabilitar a auto-estima perdida?

Todas as organizações têm picos de participação motivados por factores internos e externos. Entretanto, o timing das organizações nem sempre é de mobilização. A Associação Pró Praia passou por um período mais introspectivo e menos mediático, mas nem por isso de desmotivação. Os associados agora são chamados a uma mais intensa participação. Um dos nossos objectivos é alargar a base dos associados. Queremos uma Associação Pró Praia participada e dinâmica, capaz de reflectir o peso real da sociedade civil praiense e de poder agir em coerência.

6. Qual o seu Programa de Acção para os próximos tempos?

Temos um programa de acção pronto a ser implementado. O nosso grande desafio é de alargamento dos membros. Pretendemos também implementar um projecto de Ouvidoria Praiense, em parceria com a Edilidade. Esta Ouvidoria será também uma grande derivada para as nossas relações com as autoridades. A própria sede da Pró Praia precisa ser restaurada, embelezada e melhor aproveitada. Temos intenção de materializar uma visão cultural na cidade da Praia, ajudar a pensar a Praia como espaço privilegiado de Cultura. Pretendemos estabelecer parcerias com universidades e outros centros do saber, bem como instituições reguladores e o INE, numa perspectiva de conhecer para melhor agir. Teremos pontos focais para acompanharem as grandes questões da Praia, através dos pelouros comandados por membros destacados da nova direcção. O Programa é extenso e ambicioso. Temos de abraçar o desafio na formulação de grandes e importantes parcerias, para o poder implementar.

7. Como encara o problema energético na capital, mais precisamente o da iluminação pública da cidade da Praia?

O impasse não abona a ninguém e condiciona a vida da cidade. A cidade da Praia é o maior potencial de consumo e de receita da Electra. Sem a Praia, essa empresa teria um porte diminuto. A inversa também é verdadeira, pela importância que o factor energia possui para a qualidade de vida urbana. Esta cidade precisa ter energia proporcional ao seu imput e aos desafios impostos pela sua dinâmica. Entretanto, a questão da iluminação pública tem a sua complexidade, envolvendo partes que não se acertam em relações às responsabilidades dos custos. Vamos em breve ouvir todas as partes e formular uma posição com conhecimento de causa. A nossa postura é construtiva. Igualmente, estamos esperançosos em relação às energias renováveis. O objectivo do Governo de implementar 25% das energias renováveis a nível do país não pode ignorar o peso da cidade da Praia, se pretende de facto conseguir o impacto ecológico inerente a projectos do género. Vamos encarar a questão energética com uma visão crítica e responsável, sem por de lado a potencialidade inovadora que o sector proporciona. Outra questão gravosa é a água. O cenário de enormes filas de pessoas nos chafarizes com baldes e bidões à procura de água não é mais aceitável na Capital de um país de desenvolvimento médio. A situação de prevalecente precaridade e má qualidade de água precisa ser descontinuada e definitivamente suprida por solução de longo prazo, permitindo um equilíbrio saudável na relação procura/oferta de água na Capital.

8. E em termos de infra-estruturas. Há razões para satisfação?
Há algum trabalho feito e temos de reconhecê-lo. A Grande Circular, os asfaltamentos, o Aeroporto, o alargamento do Porto, os centros de saúde, as escolas, as praças. A Praia está mais infra-estruturada. Mas, tendo em conta a sua própria complexidade e dinâmica, ela clama por muito mais, não só em quantidade, mas sobretudo em termos de qualidade. Esperamos uma cidade muito mais requalificação. O aeroporto precisa ser reformatado, ele nasceu anacrónico. O porto também precisa ser alargado para dar vazão à enorme demanda de cargas e de passageiros, senão a separação das duas coisas. Queremos ter vias rodoviárias e passeios mais adequados à vivência e à convivência urbanas. Temos ainda uma cidade onde predominam passeios com parcos centímetros de largura, ruas e vias sem alternativa para outros meios de transporte mais saudáveis e amigos da natureza (como a bicicleta), com escassez de espaços e de parques públicos a favor de imensas rotundas. Certamente que algo não está bem. Gostaríamos que o programa de infra-estruturação fosse mais socializado com os praienses.

9. Qual a vossa posição sobre o Estatuto Administrativo Especial para a Cidade da Praia?
É uma causa de que não abriremos mão. Esperamos que isso prevaleça no texto constitucional e que os partidos políticos o viabilizem oportunamente. Este dispositivo constitucional será um factor administrativo importante para o salto qualificado que a Praia precisa dar. Iremos auscultar os partidos políticos e os cidadãos em relação a tal questão. Vamos mesmo argumentar, socializar e promover a ideia do Estatuto Administrativo Especial. Esta questão deriva de um desígnio nacional e não apenas dos praienses. Os cabo-verdianos, nas ilhas e na Diáspora, demandam isso.

10. Recentemente, o edil praiense afirmou que Praia é a Capital da Cultura. Corrobora esta opinião?
Em verdade, a cidade da Praia ganhou uma dinâmica cultural intensa nos últimos tempos. Muita música, muita literatura, muita dança, muita exposição. Uma movida de artes e letras. Tertúlias várias. O Festival da Gamboa. Os centros culturais, francês, português e brasileiro. Não sei se globalmente outros pólos de Cabo Verde têm neste momento tal dinâmica. Seria ideal que o Pais todo tivesse tamanha movida. Mas precisamos consolidar o Creole Jazz Festival. Apoiar as tabancas. Ver o Palácio da Cultura, o Museu Etnográfico, a Biblioteca Nacional, o Auditório Nacional e o Arquivo Histórico Nacional a funcionar com mais dinâmica. Precisamos de uma toponímia melhor e mais coerente. De um circuito cultural. Recuperar a história. A vila da Praia de Santa Maria surgiu em 1615, sendo antes um lugarejo e um fundeador das navegações, e a passagem oficial da capital deu-se em 1770. A Praia Negra poderia servir de um parque dedicado a Darwin. A ponte de São Januário tem a ver com a passagem de Vasco da Gama, em 1497. O Thaiti foi a Aguada da Praia, a zona da Várzea teve os Armazéns de Grão Pará e Maranhão. O próprio Plateau é um grande património histórico de Cabo Verde. Há a requalificar a orla marítima e aproveitar, em termos portuários, turísticos e de entretenimento a linda Baia da Praia, bem como o Ilhéu de Santa Maria. O potencial está aqui e temos de investir nele para que Praia seja uma grande referência cultural e história a transcender o arquipélago.

11. Usa-se dizer que a Praia é uma cidade mal-amada. É uma falácia ou uma realidade?
Longe vai o tempo em que tal cliché fazia escola e tinha adeptos. Amamos Praia. A Praia é uma cidade amada, cantada, procurada e desejada. Uma cidade multicultural, de comunidades, de residentes e visitantes. Uma babel interessante. As grandes vitórias dos artistas, como o Prémio Camões a Arménio Vieira, e dos desportistas, como os nossos futebolistas, basquetebolistas e andebolistas, por exemplo, têm levantado sobremaneira a auto-estima colectiva desta cidade. Temos de mudar de paradigma e ver a Praia com olhos de ver. É uma cidade que começa a extravasar o município e que caminha para ser metropolitana. Mais de ¼ dos residentes no arquipélago vive nesta cidade. O amor por esta cidade já nos transborda e nos transcende.

12. Já agora: a Associação Pró-Praia tem legitimidade para falar em nome dos praienses?
Tem sim. A legitimidade de quem ama, de quem cuida e de quem luta pelas causas colectivas desta cidade e que são de pertença de todos. Mesmo os não filiados, todos aqueles que amam Praia e querem qualidade de vida para esta cidade, são lacto senso da Pró Praia, que é ao fim ao cabo um movimento e uma atitude e não uma mera associação.

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